MESTRE
ECKHART(*):
No sermão “O Amor é forte como a morte” (cf.
Cântico dos Cânticos), Mestre Eckhart faz propostas de grande sabedoria
espiritual. Tomemos o amor como a capacidade de acolhimento do Outro enquanto
autêntico Outro, e não como projeção das minhas fantasias, desejos e
expectativas. É o acolhimento do Outro na gratuidade, sem espera de retorno ou
resultado. É escolher e praticar o bem do Outro, o serviço ao Outro pelo Outro,
e não pelo que o Outro pode me dar em troca. Este é o Amor Incondicional, este
é o Amor Pleno. Este é o amor Ágape, o amor que Jesus veio testemunhar, o amor
que Aurobindo, Teilhard de Chardin e outros místicos proclamaram e praticaram
ao longo de suas vidas e seus escritos. O centro da atenção de Eckhart neste sermão é
a ideia de que o amor a Deus nos chama ao desapego de tudo aquilo que temos
nesta existência, e de que a Morte vem nos privar. As três principais coisas que os humanos
deixam quando fazem a Grande Passagem desta vida para outra são também aquelas
das quais Eckhart nos convida ao desapego:
1* O que é passageiro – Eckhart nos convida a
listar tudo que temos e tudo que somos durante esta travessia pela existência
terrena: amigos, bens, honras, todas as criaturas... até mesmo o próprio corpo!
Quem faz a Passagem já não pode praticar virtudes nem acumular méritos, já não
pode realizar o amor carnal, já não pode cuidar da sua saúde física. Já não
possui nada que só tome em consideração ele próprio, já não se movimenta com
intenção utilitária, visando só o seu próprio bem ou o dos outros.
2* Os bens e as consolações espirituais – são
os bens que dão alegria à alma: beleza, ética, estética, comunicação,
meditação, alegria ou tristeza, devoção, oração, virtude, êxtase, sede do
Divino. Tudo isto sai do nosso alcance quando fazemos a Passagem. Sendo a morte
um fato que separa a alma do corpo físico, o amor pelo Divino também mata o
homo no sentido espiritual. Isto porque para chegar ao amor o homo tem que se
desapegar do seu Eu, de certa forma separar-se de si mesmo pela força sublime
do amor “que sabe matar com tal suavidade.” É quando o homo abandona todo
egocentrismo, já não vive esta vida para proveito próprio.
3* A radicalidade de Eckhart é incômoda para
quem não se coloca como missão de vida o amor incondicional. Ele diz que é
preciso desapegar-nos de toda expectativa de recompensa e todo mérito que ainda
possamos ganhar como resultado do amor e do serviço ao próprio Ser Divino, até
mesmo o tesouro da ‘vida eterna’. Desapegar-se do Divino, para que o Divino
possa acolhe-nos em plena liberdade, e na plena liberdade nós possamos escolher
o Divino, acolher o Divino, amar o Divino. “Ah, Deus! Quem poderia jamais levar
a cabo esta tarefa se não constrangido pelo próprio amor a Te abandonar e a se
desvencilhar de Ti por Ti. Quem poderia sacrificar a Deus o que tem de melhor e
mais precioso – Ele próprio – por amor a Ele?!”
Resta examinarmos se a Encarnação não
foi a linguagem divina para nos mostrar que devemos viver na plenitude de nós
próprios – Corpo e Alma, Matéria e Espírito, como Jesus Cristo nos mostrou na
Sua existência terrena. Se não somos chamados a cultuar a Matéria e a Mãe Terra
como origens matriciais da vida, instrumentos sagrados da Criação e da
Encarnação, da Morte e da Ressurreição, manifestações diversas do Uno que dá
origem, sustenta, anima e faz convergir para Si todas as formas de vida.(*) Eckhart de Hochheim, O.P. (Tambach, Turíngia, 1260 – Colonia, 1328), mais conhecido como Mestre Eckhart, em reconhecimento aos títulos acadêmicos obtidos durante sua estadia na Universidade de Paris, foi um frade dominicano, reconhecido por sua obra como teólogo e filósofo e por seu misticismo. Ele é considerado como um dos grandes símbolos do espírito intelectual da idade média.
(**) NOTA: Este artigo foi uma colaboração enviada para nosso Blog pelo Professor e Economista Marcos Arruda
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